quarta-feira, 10 de março de 2010

o papel do assessor de imprensa na divulgação científica

JORNALISMO CIENTÍFICO
Assessor de imprensa e divulgação científica (*)

Elaine de Sousa (**)

A proposta deste artigo é relatar o papel do assessor de imprensa na divulgação científica. Antes, porém, são necessárias algumas considerações. Não é possível distinguir o papel do jornalista da função do assessor de imprensa – assim como não se distingue ética pessoal de ética profissional. Isso porque trata-se da mesma profissão. Ambos têm compromisso com a qualidade da informação. A assessoria de imprensa é, na verdade, um cargo ocupado por jornalistas. E, assim como o cargo do repórter tem suas especificações o do assessor tem algumas peculiaridades.

O papel primeiro do assessor de imprensa (nome, aliás, praticamente em extinção e, portanto, substituído a partir de agora por assessor de comunicação pela amplitude de sua atuação) é mediar o contato e as informações entre a Imprensa e o assessorado.

Neste contexto, quanto mais claro a empresa/instituição tiver sua missão e seus objetivos, mais fácil será o trabalho da assessoria de comunicação. Longe do porta-voz da empresa que mantém relacionamentos com a Imprensa por meio de presentinhos e bajulações, o assessor de comunicação precisa conquistar a confiança e credibilidade tanto do assessorado quanto da mídia em geral. E, isso só é conseguido com muito trabalho, ética e bom senso. É claro que o bom relacionamento com a Imprensa passa pela amizade e cordialidade, mas é fundamental não abusar da descontração com excesso de intimidade.

Relação profissional

Um trabalho sério não se sustenta por meio de amizades, até porque as pessoas mudam de emprego, nos veículos de comunicação entram e saem editores, enfim, o importante é que o jornalista que precisa dessa ponte – entre o assessor e o seu assessorado – saiba que do lado de cá há alguém competente, capaz de reconhecer o que é ou não notícia e pronto para agilizar o trabalho da redação. O assessor deve ser acessível, retornar as ligações telefônicas da imprensa com rapidez e estar sempre preparado para passar as informações. Outra coisa a se considerar é que o tempo de quem está nas redações deve ser usado para melhorar a qualidade da notícia que vai estampar as páginas do jornal do dia seguinte ou a telinha da tevê e do micro ou, ainda, soar nas ondas sonoras do rádio.

Entre as funções do assessor estão orientações ao assessorado sobre como receber a Imprensa, qual a linguagem certa, a abordagem ideal e, principalmente, a importância da informação oferecida que, em geral, é de utilidade pública. No caso específico de temas científicos relacionados à saúde, o trabalho, algumas vezes, exige atenção e dedicação redobradas. A polêmica é conhecida: cientistas, em geral, temem pelo tratamento que o repórter dará à notícia por ele divulgada. Repórteres reclamam que os cientistas se trancam em seus laboratórios sem dar atenção ao tempo daquela notícia que poderia ter um grande destaque. Neste conflito, o assessor de comunicação tem um árduo trabalho.

Primeiro, ele precisa convencer os cientistas/médicos da instituição para qual trabalha de que nem todos os jornalistas tratam as notícias de forma sensacionalista ou irresponsável e, principalmente, da importância social e científica daquela divulgação. Depois, o assessor precisa realizar um trabalho com as redações no sentido de modificar a imagem negativa que os cientistas/médicos da instituição podem ter deixado – às vezes, recusando entrevistas, apresentando comportamentos inadequados, etc.

Felizmente, a dinâmica estabelecida para a relação entre a empresa ou instituição e as assessorias de comunicação está cada vez mais profissional. Isso implica em vantagens para ambos os lados. O assessorado tem sua imagem reforçada à medida em que ganha mais espaço nos veículos de comunicação. Os assessores, por conseqüência, passam a contar com canais de exclusividade dentro da própria empresa/instituição e têm o trabalho cada vez mais facilitado em virtude dos resultados dessa relação.

A saúde da informação

No caso específico da Assessoria de Comunicação do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo – o Centrinho/USP –, a equipe adotou um lema bastante sadio "informação: um remédio sem contra-indicação". Traçamos um planejamento de comunicação interna e externa que tem funcionado. Até mesmo aqueles pesquisadores mais arredios, que tiveram, num momento ou outro, experiências negativas com jornalistas, estão se rendendo a um trabalho bem planejado e, acima de tudo, transparente. Percebemos que os pesquisadores também têm insegurança.

Eles querem divulgar o trabalho que desenvolvem mas, muitas vezes, ficam com medo do tratamento dado à notícia ou, até mesmo, não sabem como fazer a notícia acontecer. Para esses casos, "receitamos" nossa companhia e nossas dicas. Verificamos do que se trata, preparamos uma pré-pauta e um release e, a partir de então, nos colocamos à inteira disposição da imprensa e do candidato a entrevistado. Ambos, assessorado e imprensa, precisam de informações claras e objetivas. O entrevistado quer saber como será a entrevista, que tempo ele terá, se sua descoberta não será distorcida... Ele precisa, portanto, conseguir confiar no repórter. No primeiro momento, cabe ao assessor esclarecer as dúvidas do assessorado e colocá-lo à vontade.

Satisfação da fonte

A partir daí, tudo flui. Porém, nunca vamos conseguir garantir ao entrevistado que a matéria sairá "redonda". Por isso, precisamos de atenção redobrada na hora de assessorar aquela informação. Depois, Inês é morta. É erro fatal pedir a um repórter para ler sua matéria antes da publicação – e nossos assessorados sabem disso muito bem. Alguns veículos, no entanto, já estão adotando a postura de retornar à fonte para verificar se não houve nenhum erro de informação. Nesse caso, aceitamos a proposta e conferimos se está tudo ok.

Essa, aliás, é outra longa discussão. Muitos especialistas sentem-se no direito de ler a matéria antes da publicação. Mas, como disse a jornalista Sabrina Magalhães, do Jornal da Cidade (JC, de Bauru), o especialista também precisa confiar no repórter, afinal cada um tem sua especialidade e a do jornalista é justamente transformar a informação técnica recebida em texto "publicável e digerível" – uma alusão ao tema da mesa redonda da qual Sabrina participou durante o "I Encontro de Comunicação, Saúde e Terceiro Setor", organizado por nossa assessoria em parceria com a Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC/Unesp) e a Universidade do Sagrado Coração (USC), realizado no último mês de abril, no campus da Unesp.

Portanto, nesses casos, preferimos sempre confiar no repórter e também no nosso trabalho de bastidor. Até porque nos jornais diários esse retorno é praticamente inviável, devido ao deadline e à quantidade de matérias que precisam ser finalizadas nesse curto período.

No Centrinho/USP, no entanto, tivemos algumas experiências interessantes. Uma revista científica, cuja redação funciona no Rio de Janeiro/RJ, nos procurou para divulgar uma pesquisa na área de genética. Nossa assessoria esclareceu algumas dúvidas da repórter e solicitou que a entrevista fosse feita via e-mail em função da complexidade do tema. Por telefone a probabilidade de perder alguma informação, sobretudo em casos tão complexos, é sempre maior. A repórter enviou as perguntas para o e-mail da Assecom, nós acompanhamos as respostas do pesquisador e encaminhamos para a revista. Resultado: para nossa surpresa, no dia seguinte, recebemos o texto finalizado para conferência.

A matéria foi publicada e teve ótima repercussão.

Imagem institucional

Além de cuidar do relacionamento imprensa/assessorado, a Assecom desenvolve uma série de trabalhos que, em última instância, colaboram para manter a boa imagem do Centrinho/USP – o que, aliás, não é difícil, já que se trata de uma instituição pública que presta serviços de reconhecimento nacional e internacional há mais de 35 anos. É nossa responsabilidade também cuidar da comunicação visual do hospital, para isso há dois comunicadores visuais que criam identidade, sinalização e desenvolvem projetos gráficos para todas as publicações e materiais da instituição.

O casamento jornalistas/designers é responsável pelo visual e conteúdo do portal do Centrinho/USP (http://www.centrinho.usp.br), jornal "Em Foco", boletim "Diálogo", revista "Fundação!" e demais fôlderes, relatórios institucionais, cartazes, banners, etc. Com essa comunicação integrada – incluindo também a equipe do Eventos e da Reprografia –, atendemos a todo o público do hospital – pacientes, profissionais, funcionários e órgãos públicos.

Reflexões e provocações

Aliviar o sofrimento humano parece-me ser o objetivo fundamental do médico. Curar as doenças e preveni-las são objetivos decorrentes do primeiro. Pensando nisso, coloco-me a refletir sobre qual seria o objetivo primordial do jornalista... Alguém diria: informar. Outros: formar opinião. E há quem complemente: o jornalista informa e forma, ele influencia uma sociedade inteira. É verdade. Mas não é tudo.

Numa nova ordem mundial, com avalanches diárias de informações, verbais e não-verbais, o papel do jornalista parece ser maior. Ele é um mediador dos fatos, um especialista em generalidades, e, como tal, precisa ter consciência do peso atribuído a cada palavra sua, proferida ou escrita. Seu compromisso é com a informação de qualidade.
O ato de informar depende, portanto, de uma contextualização do acontecimento e de elementos capazes de transmitir ao leitor/telespectador os fatos como se passaram para que ele – o leitor/telespectador – esteja munido de informações suficientes, capazes de fazê-lo tirar suas próprias conclusões.

Quando o tema informado é sobre saúde a responsabilidade é a mesma.

Mas vale aqui uma reflexão: como estão as coberturas jornalísticas sobre saúde? Até pouco tempo, eram publicadas matérias sobre doenças, epidemias, quando – é claro – elas estavam agindo sobre uma comunidade. Depois, acompanhando até mesmo a evolução dos veículos eletrônicos, da Internet, houve uma proliferação de matérias de orientação e prevenção de doenças. É claro que tudo isso é importante. Mas houve uma banalização dos temas de saúde e um crescimento questionável de publicações mais parecidas com bulas do que propriamente matérias jornalísticas.

Identificação com o público

Ainda é tímido o número de matérias com abordagens mais próximas das reflexões do leitor ou com análises sobre o processo de uma pesquisa – do motivo de chegar ao laboratório até suas conseqüências ao ser aplicada... Talvez a pergunta seja: até que ponto uma matéria de saúde é útil ao seu leitor? Quando divulgamos os sintomas de uma doença, por exemplo, estamos fazendo um esclarecimento público, mas será só esse o papel do jornalista? Tais informações não seriam substituídas por folhetos, distribuídos nos postos de saúde?

Mesmo nos cenários mais técnicos e frios, como os corredores de um hospital, a melhor saída é buscar a resposta junto à comunidade. Buscar os personagens, suas dúvidas e angústias, é a melhor e única maneira de enriquecer e humanizar uma matéria jornalística. Sair da frente do computador – frio e condescendente – e descer a ladeira que leva à primeira aldeia é o recurso mais sofisticado de nossa profissão. E isso cabe tanto ao repórter da redação diária quanto ao assessor de comunicação.

Com isso, surge a primeira resposta: o objetivo primordial do jornalista seria viver a realidade de uma população e dela extrair o que é notícia. Até mesmo os assuntos que dependem de decisões governamentais ou de grandes executivos causam uma reação popular, por isso é importante buscar sempre a voz da comunidade. Isso não significa, porém, que esta será a única voz. O nosso papel é ouvir vários pontos de vista e dar voz a eles, desde que bem fundamentados. Esse é o papel do repórter. Esse é o papel do assessor. Não importa onde ele atua, nem em qual área do conhecimento.

(*) Publicado originalmente na revista eletrônica Science.net (nº 46 – julho de 2003), ; título original: "O papel do assessor de imprensa na divulgação científica"

(**) Jornalista da Assessoria de Comunicação Funcraf/Centrinho-USP

Fonte: Observatório da Imprensa acesso 10 março 2010

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